Grupo acusado de fraude na Lei Rouanet recebe R$ 64 milhões da Saúde
Grupo farmacêutico envolvido em esquema de irregularidades na Lei Rouanet assinou contrato de R$ 64 milhões com o Ministério da Saúde
atualizado
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O Ministério da Saúde contratou por R$ 64,5 milhões, em janeiro deste ano, o grupo farmacêutico Takeda para fornecer concentrado de fator de coagulação, medicamento essencial no tratamento de distúrbios hemorrágicos como a hemofilia.
O acordo foi celebrado mesmo após o grupo ter sido multado em R$ 3,2 milhões pela Controladoria-Geral da União (CGU), em 2023, por desvio de finalidade e uso indevido de renúncia fiscal por meio da Lei Rouanet.
A penalidade aplicada à Takeda teve como base as investigações da Operação Boca Livre, deflagrada pela Polícia Federal, em 2017, durante a gestão do então ministro da Justiça, Alexandre de Moraes.
As apurações revelaram que a Nycomed Produtos Farmacêuticos — incorporada pela Takeda em 2011 — utilizou recursos públicos destinados a projetos culturais para financiar ações de interesse corporativo, contrariando os objetivos da legislação de incentivo.
Os atos investigados ocorreram entre 2008 e 2011, quando a Nycomed ainda operava como empresa independente.
No entanto, a Takeda foi responsabilizada istrativamente após incorporar a companhia.
A CGU concluiu que houve desvio de finalidade dos recursos incentivados, originalmente destinados à promoção cultural, e que acabaram sendo direcionados a atividades promocionais da farmacêutica.
Entre as ações custeadas irregularmente, estão a celebração dos 60 anos da companhia e a produção de livros institucionais utilizados em campanhas internas.
Esses eventos foram viabilizados por meio do patrocínio de três projetos culturais — dois shows e uma publicação — que, segundo a CGU, foram descaracterizados para atender a interesses comerciais, prática expressamente vedada pela Lei Rouanet.
A CGU apontou que a empresa se valeu de interpostas pessoas jurídicas e físicas, configurando uma tentativa de ocultar sua participação direta.
Os nomes citados foram a empresa Vision Mídia e Propaganda e a pessoa física Kátia dos Santos Piauy, ambas ligadas ao chamado Grupo Bellini Cultural.
Ainda conforme o relatório, o Grupo Bellini atuava como intermediário e executor de projetos financiados com recursos incentivados.
A CGU afirma que a Takeda celebrou acordos com o grupo para direcionar os recursos públicos a objetivos corporativos.
A Vision e Kátia Piauy teriam viabilizado a apresentação e execução das propostas junto ao então Ministério da Cultura.
A CGU também destacou que a Takeda já possuía um histórico consolidado no uso da Lei Rouanet, com mais de 70 projetos aprovados entre 1999 e 2015, totalizando mais de R$ 9 milhões em aportes.
Esse contexto, segundo o órgão de controle, enfraqueceu a alegação de desconhecimento da legislação ou erro de interpretação.
O que diz a empresa
Em sua defesa, a Takeda alegou boa-fé, disse ter sido induzida ao erro pelo Grupo Bellini e destacou o pagamento voluntário dos tributos relacionados aos projetos investigados. Negou, ainda, ter participado de qualquer plano fraudulento.
A CGU, no entanto, rejeitou os argumentos e concluiu que houve fraude na destinação dos recursos públicos para fins privados.
Procurado pela coluna, o grupo Takeda declarou que cumpriu integralmente todas as determinações da CGU, encerrando o processo.
“Na ocasião, a empresa colaborou com as investigações e cumpriu a penalidade aplicada, reafirmando seu compromisso com a ética e a transparência.
Ressaltamos que não houve, em nenhum momento, qualquer impedimento para que a empresa continuasse fornecendo medicamentos ao governo brasileiro.
Os contratos são firmados em total conformidade com a legislação e os trâmites legais, refletindo o compromisso da Takeda em contribuir para o o à saúde no Brasil.”
O que diz o Ministério da Saúde
O Ministério da Saúde, por sua vez, informou que a Takeda Distribuidora participou regularmente do Pregão Eletrônico nº 90112/2024, destinado ao fornecimento de concentrado de fator de coagulação IX, tendo atendido a todos os critérios técnicos e jurídicos estabelecidos no edital e se sagrado vencedora.
“Para participar de processos licitatórios, é exigido o cumprimento de uma série de requisitos legais e documentais. A empresa apresentou toda a documentação necessária e não possuía qualquer restrição nos cadastros oficiais consultados, como o Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores (SICAF), Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas (CEIS), Cadastro Informativo dos Créditos não Quitados do Setor Público Federal (CADIN), certidão do Tribunal de Contas da União (TCU), entre outros.”