Vivam os Beach Boys! (Por Miguel Esteves Cardoso)
Brian Wilson morreu, mas a música dos Beach Boys (e dos Byrds) continua por conhecer
atualizado
Compartilhar notícia

Os lamentos sobre a morte de Brian Wilson– variações sobre o génio que poucos reconheceram ou compreenderam – fazem lembrar canções de Brian Wilson: são fantasias.
Brian Wilson esteve vivo muito tempo e recebeu todos os elogios que teve paciência para receber.
Mas existe uma astúcia terrível no que toca a Brian Wilson: é isolá-lo dos Beach Boys. Esconde – ou procura esconder – uma culpabilidade ainda mais terrível: não ter reconhecido, e continuar a não reconhecer, o génio dos Beach Boys.
Não foi só em Portugal: os Beach Boys eram considerados betinhos americanos que faziam música a metro, ideal para descapotáveis, pranchas de surf e idiotas de bikini e de bermudas.
As obras-primas de Brian Wilson são obras-primas dos Beach Boys. Isto é óbvio.
Mas também é óbvio que vivemos na Europa e que é mais fácil reconhecermos o génio dos Beatles e dos Rolling Stones do que reconhecermos o génio dos Beach Boys e dos Byrds.
Enquanto toda a gente sabe apontar para a influência dos Beatles e dos Stones sobre a música americana, quantos europeus conhecerão a dívida profunda que os Beatles e Stones tinham para com a música americana que copiavam descaradamente?
Brian Wilson morreu, mas a música dos Beach Boys (e dos Byrds) continua por conhecer.
Não, não é só Pet Sounds. Gostar de Pet Sounds é como gostar de Brian Wilson: é uma maneira de excluir a música dos Beach Boys, atribuindo-a a um génio.
Imagine-se que se fazia o mesmo a John Lennon e a Mick Jagger, para poder esquecer a música dos Beatles e dos Stones.
Brian Wilson era um fantasista e um construtor de mundos. Arranjava quem soubesse escrever para escrever as letras e quem soubesse tocar para fazer as gravações.
Nunca foi surfista: mas sonhava ser. Não na realidade (porque gostava de ser música), mas nos sonhos, por causa da ideia, por causa do amor, por causa do mar.
Conseguiu construir um mundo onde todos cabemos, por muito longe que estejamos do oceano, ou dos EUA – ou da juventude.
(Transcrito do PÚBLICO)